Ensinando discípulos - parte 1 - Comentário da LES
Marcos 8:34
A. O evangelho de João Marcos indica, com várias citações, que o ministério de Jesus foi pautado pela ênfase na "pregação" e no "ensino". Assim como João, Jesus inicia e desenvolve seu ministério com foco no que Ele precisava passar a seus discípulos a fim de prepará-los para os eventos finais de Seu ministério. Ao passo que avança para aquilo para que veio realizar Jesus passa a deixar ainda mais claro Sua missão e objetivo. Para isso, terá de tirar tempo suficiente e de qualidade para orientar os discípulos (Marcos 9:30 a 32).
Em meio as oportunidades encontradas por Jesus para ensiná-los Marcos destaca a incompreensão dos discípulos quanto a identidade de Jesus e o objetivo de Seu ministério. Marcos 4:41; 6:52; 7:18; 8:21, 29 e 32; 9:10 e 32, apontam que em várias ocasiões os discípulos não compreendiam os ensinos, parábolas, palavras e previsões de Jesus. Por exemplo, sua previsão quando a Seu sofrimento, morte e ressurreição (cf. Marcos 9:31 e 32). Assim, em meio a Suas ações de ensino e cura junto ao povo Jesus precisou tirar tempo para, em particular, orientar Seus discípulos quanto a natureza de Sua missão e discipulado.
B. Vendo claramente - Há uma beleza singular nas páginas da Bíblia. Beleza que pode ser minimizada quando dedicamos à leitura do texto sem o devido e, necessário, auxílio divino. Bem como, sem a devida atenção e cuidado.
- Como sempre, o texto bíblico não pode ser lido fora de seu contexto. O texto e o contexto estão interligados dentro de uma mesma perícope. Isso ocorre em Marcos 8:22 a 32.
- Nestes dez versos encontra-se um contexto dividido em duas partes. Primeiro o relato da cura em dois tempos do cego e, em seguida, o questionamento de Jesus quanto a Sua identidade.
- A cura em dois tempos (vs.22 a 26):
- Temos um "cego" a quem Jesus toma pela "mão" (v.23a).
- Após processar a primeira parte da cura Jesus faz uma "pergunta": Vês alguma coisa? (v.23d)
- O homem vê mas não "claramente" (v.24).
- Após a segunda fase da cura o homem passa a "ver claramente" (v.25).
- Por último Jesus dá uma recomendação (v.26).
- A identidade de Jesus (vs.27 a 32):
- Temos os discípulos que não conseguem "ver" com clareza quem é Jesus (v.27).
- Após questionar a respeito do povo Jesus faz uma "pergunta": Mas vós, quem dizes que eu sou? (v.29b).
- Pedro responde. Mas a resposta e subsequente reprovação à Jesus mostra que eles não "compreendem claramente" (v.29d).
- Após a resposta de Pedro, Jesus passa a explicar Sua missão "claramente" (v.31 e 32).
- Por fim termina com uma repreensão/exortação de Jesus (v.30 e 33).
- O texto coloca em evidência que mais do que a cura e o questionamento de Jesus em relação a Sua identidade o objetivo do mesmo é revelar que, assim como o homem precisou de uma ação repetida por Jesus (a cura em dois tempos) para que pudesse enxergar "claramente", os discípulos também, precisariam de uma uma ação repedida (deixar claro quem Ele é e o que veio fazer), de Jesus para ajudá-los a compreender quem Ele é e, qual a Sua missão.
C. O custo do discipulado - Não é de se admirar que Jesus estivesse em busca de tempo oportuno para investir no ensino mais aprofundado de Seus discípulos (cf. Marcos 9:31). Seria necessário mais tempo para que eles pudessem compreender quem Ele era e, qual a natureza e custo de Sua missão.
- Os primeiros 8 capítulos de Marcos são utilizados para revelar aos discípulos (e ao leitor), quem Jesus é. O objetivo é a revelação da humanidade e, principalmente, a divindade de Jesus.
- Uma vez revelado quem é Jesus (cf. 8:29), uma revelação realizada pela ação direta de Deus Pai (cf. Mateus 16:17), agora Ele precisa revelar a natureza e objetivo de Sua missão.
- A clara visão de quem Jesus é, proporciona uma clara visão de Seu ministério. E, uma clara visão de Seu ministério, proporciona uma clara visão do custo do discipulado.
D. O monte e a multidão - O capítulo 9 inicia e termina de modo bastante enigmático, com declarações que, aparentemente, estão desconectadas e não decifradas. No entanto, analisadas em separadas podem nos ajudar a compreender o propósito divino.
- A transfiguração - Ao que parece o episódio esta diretamente ligado a declaração de Jesus no verso 1. Isso porque Jesus é visto com as mesmas características que apresentará por ocasião de Sua segunda vinda.
- Ao mesmo tempo, o que chama a atenção é que de tudo o que foi conversado entre Moisés, Elias e Jesus, somente uma frase, os discípulos compreenderam com clareza: "Este é o meu Filho amado; a ele ouvi". Por que?
- A resposta surge quando conectamos o verso 7 ao capítulo 8:29, a declaração de Pedro e o subsequente ensino de Jesus sobre Sua morte e ressurreição. Isso porque, a frase dita por Deus reforça a declaração de Pedro (Tu é o Cristo) e, a frase "a Ele ouvi", reforça o que Jesus precisava ensinar sobre Sua morte na cruz.
- Imediatamente, Marcos relata o episódio da cura de um endemoniado, onde claramente o tema principal é a "incredulidade e o poder contido no nome de Jesus".
- A declaração referente a "geração" liga o texto a Marcos 3:20; 6:6 e 8:12 e 38, uma vez que os personagem presentes não criam em Jesus.
- Ao mesmo tempo, o relato se conecta ao ocorrido no monte, uma vez que Lucas 9:30 e 31 afirma que o diálogo foi sobre a "partida" (morte), de Jesus. Pois Jesus usa a ocasião para questioná-los quanto ao tempo em que estará disponível ao povo. Deixando claro que não estará disponível junto deles por muito mais tempo.
E. Quem é o maior? - O relato referente a cura do menino possesso (Marcos 9:27) termina sem uma cena de aclamação ao poder de Deus, mas com uma pergunta dos discípulos sobre a impossibilidade de expulsar o demônio.
- Essa pergunta é importante pois conecta este relato com a transfiguração e com, os versos 33 a 37, onde é relatado a discussão sobre quem é o maior.
- Ao final do relato da cura todos os discípulos foram nivelados por igual, pois nenhum deles pode realizar o que o pai do menino pediu. Pelo contrário, Jesus resolveu o problema. Logo, Jesus, como foi mostrado no monte (cf. 9:7), é o Maior entre eles.
- Agora, ao declarar que o "maior ou primeiro", será o "servo" Jesus volta a atenção dos discípulos para os versos 30 a 32 onde por meio do tema de Sua morte, Ele aponta que mesmo sendo o Maior entre eles, se entregará na cruz como "servo de todos".
F. Fazer tropeçar - Jesus termina o capítulo 9 com uma declaração bastante intrigante sobre o "fazer tropeçar", logo em seguida acrescenta orientações sobre o "sal e o fogo", aparentemente, citações desconectadas. Contudo, todas estão relacionadas aos ensinos apresentados anteriormente.
- Os versos 42 a 48 traça um contraste entre salvação e perdição usando termos como "vida, e reino de Deus", em contraste com "inferno e fogo". Isso para deixar claro que o tema tratado se refere ao juízo de Deus ou destino eterno de todos nós.
- Ao mesmo tempo, o texto destaca o tema do "despendimento ou da negação pessoal", já abordado no capítulo 8:34 a 38 e capítulo 9:35 a 37. Isso fica compreensível com as palavras "corta-a e arranca-o".
- Ao mesmo tempo, os versos 42 a 50 estão conectados com os versos 38 a 41, onde Jesus adverte os discípulos a não "proibir" outros de agirem "em nome de Jesus". Caso fizessem isso estariam levando outros a "tropeçar".
- A palavra traduzida como "tropeço" aqui é o palavra "Skandalizó", que tem a ideia de:
- Eu faço tropeçar, faço pecar, faço ficar indignado, chocar, ofender. [Figurativamente] impedir a conduta ou pensamento correto; fazer tropeçar – literalmente, "cair em uma armadilha". (fonte:https://biblehub.com/greek/4624.htm).
- Assim, impedir alguém de agir em nome de Jesus ou ensinar algo errado a alguém, impedindo um determinado modo de pensar ou conduta correta, é pecado e condenável por Deus.
Destaque:
A. Divinamente inspirado Marcos constrói a narrativa do ministério de Jesus com o intuito de mostrar que primeiro Jesus chama o discípulos. Em seguida dá provas de quem Ele é (revelação). Para só então, revelar a natureza e objetivo de Sua missão. Essa sequencia é parte do processo natural do discipulado, pois nesse momento, o discípulo é levado a tomar uma decisão: Perder a vida para confiar na salvação de Jesus, ou, preservar sua vida e perder a salvação oferecida por Jesus? Essa decisão não se concentra mais em aceitar seguir Jesus, mas sim em fazer isso ate o fim. Mesmo que o custo seja entregar a própria vida pelo evangelho.
B. A declaração de Jesus no verso 33, do capítulo 8, revela que enquanto Jesus estava falando sobre assuntos "divinos", os discípulos pensavam em assuntos "humanos e terrenos". A fim de deixar claro de qual assunto esta tratando e a natureza de Seu ministério Jesus os exorta com a declaração do verso 34 (Se alguém quer vir após mim). Verso que esta diretamente conectado com a declaração de Cristo descrita no capítulo 9:34 e 35 (Se alguém quer ser o primeiro). Ambos os textos ou declarações apontam para o custo de colocar o evangelho e o Reino de Deus em primeiro lugar.
Aplicação:
A. Marcos 8:27 a 9:37, pode facilmente ser conectado a Deuteronômio 28. Isso porque, ambos os textos trataram de benefícios e custos de aceitar o evangelho. Em Deuteronômio, aceitar a Aliança que Deus oferece, envolve ter acesso a bençãos, mas também, uma dura advertência referente as maldições. Em Marcos 8 e 9, aceitar o Evangelho e dele fazer parte como discípulo, envolve ter acesso a vida eterna, mas também, ao custo do discipulado (sofrer muitas coisas (cf. Marcos 8:31)). Jesus deu aos discípulos a oportunidade de escolher. Assim como, oferece a nós também.
Pr. Vítor de Oliveira Ribeiro - Sagrada Família - MMN - USeB
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