A Bíblia e a História - Primeiro Concílio de Niceia
O Primeiro
Concílio de Niceia foi um concílio de bispos (epíscopos) cristãos
reunidos na cidade de Niceia da Bitínia (atual İznik, Turquia), pelo imperador romano Constantino em 325. O concílio foi a
primeira tentativa de obter um consenso da igreja através de uma assembleia representando toda a cristandade.[2]
O
seu principal feito foi o estabelecimento da questão cristológica entre Jesus e Deus, o Pai; o estabelecimento da doutrina
Papal, ou Estado; a construção do Credo Niceno; a fixação da data da Páscoa; e a promulgação da lei canônica.[3][4]
Localização e
participantes
Niceia
(hoje İznik), é uma cidade da Anatólia (hoje parte da Turquia). No verão de 325,
os bispos de todas as províncias foram
chamados ao primeiro concílio ecumênico em Niceia: um lugar facilmente acessível à
maioria dos bispos, especialmente aos da Ásia, Síria, Palestina, Egito,
Grécia, Trácia e Egrisi (atual Geórgia ocidental). O número dos membros
não pode exatamente ser indicado; Atanásio contou 318, Eusébio somente
250. Foram oferecidas aos bispos as comodidades do sistema de transporte
imperial - livre transporte e alojamento de e para o local da conferência -
para encorajar a maior audiência possível. Constantino abriu formalmente a
sessão.
A
religião cristã nesses tempos era majoritária unicamente no Oriente. No
Ocidente, era ainda minoritária, especialmente entre os pagãos (do latim paganus,
que significa "camponês", "rústico"), pois grande parte da
população vivia no campo. Daí o nome de pagãos para os gentios. Uma exceção era
a região de Cartago ou Túnis. Portanto, os bispos orientais estavam
em maioria; na primeira linha de influência hierárquica estavam três
arcebispos: Alexandre de
Alexandria, Eustácio de Antioquia,
e Macário de Jerusalém,
bem como Eusébio de Nicomédia e
Eusébio de Cesareia. Entre os bispos encontravam-se Estratófilo, Bispo de
Ptiunte (Bichvinta, reino de Egrisi).
O
ocidente enviou não mais de cinco representantes na proporção relativa das
províncias: Marco de Calábria da Itália,
Ceciliano de Cartago da África, Ósio de Córdova (Hispânia), Nicásio de Dijon na França, e Dômno de Estridão da província
do Danúbio. Estes dignitários eclesiásticos
naturalmente não viajaram sozinhos, mas cada qual com sua comitiva, de modo que
Eusébio se refere a um grupo numeroso de padres acompanhantes, diáconos e
acólitos.
Entre
os presentes encontrava-se Atanásio, um diácono novo e companheiro do
bispo Alexandre de Alexandria, que se distinguiu como o "lutador mais
vigoroso contra os arianos" e
similarmente o patriarca Alexandre de
Constantinopla, um presbítero, como o representante de seu bispo,
mais velho.
O
papa em exercício na época, Silvestre I, não compareceu ao concílio, que
aconteceu no Oriente, a grande distância de Roma. Assim os papas não
participavam dos primeiros Concílios e enviavam representantes seus.
Entretanto, importante ressaltar que as sedes patriarcais sempre eram consultadas
na resolução das grandes questões. Silvestre já fora informado da condenação
de Ário, ocorrida no Sínodo de Alexandria (320 a 321)
e para o Concílio de Niceia enviou dois representantes, Vito e Vicente
(presbíteros romanos).
Segundo
Atanásio, contemporâneo dos eventos (Apol. de fuga sua, c. 5), quem presidiu o
concílio foi Ósio de Córdova. Também afirmam-no implicitamente os próprios
arianos escrevendo que ele "publicara o sínodo de Niceia" (Ap.
Athânas, Hist. arian. c. 42).
Outra
fonte de influência, apesar do não comparecimento do Bispo de Roma, é que as assinaturas dos três
clérigos - Ósio, Vito e Vicente - estão sempre em primeiro lugar, bem como a
citação de seus nomes pelos historiadores do Concílio, o que seria estranho,
dado que o concílio se deu no Oriente e os três clérigos eram ocidentais - o
primeiro um bispo espanhol e os outros dois sacerdotes romanos. Só o fato de
serem representantes do Papa explicaria tal
comportamento.
As questões
doutrinárias
Este
concílio deliberou sobre as grandes controvérsias doutrinais do cristianismo nos séculos IV e V. Foi efetuada uma união entre o
extraordinário eclesiástico dos conselhos e o Estado, que concedeu às deliberações deste
corpo o poder imperial. Sínodos anteriores tinham-se dado por satisfeitos com a
proteção de doutrinas heréticas. Porém o concílio de Niceia foi caracterizado
pela etapa adicional de uma posição mais ofensiva, com artigos minuciosamente
elaborados sobre a fé. Este concílio teve uma importância especial também
porque as perseguições aos cristãos tinham recentemente terminado, com o Édito de Constantino.
A questão ariana representava um grande
obstáculo à realização da ideia de Constantino de um império universal, que
deveria ser alcançado com a ajuda da uniformidade da adoração divina.
Ícone com os Pais Sagrados do Primeiro Concílio de
Niceia e o imperador Constantino, que exibe
não o texto original do Credo Niceno (do ano 325) senão uma
versão modificada do Credo
niceno-constantinopolitano do Primeiro
Concílio de Constantinopla (ano 381)
Os
pontos discutidos no sínodo eram:
·
A questão ariana
·
O cisma de Melécio de Licópolis
·
O estatuto dos
prisioneiros na perseguição de Licínio.
Embora
alguns afirmem que no Concílio de Niceia discutiu-se que evangelhos fariam
parte da Bíblia, não há menção de que esse assunto
estivesse em pauta, nem nas informações dos historiadores do concílio, nem nas
atas do concílio que nos chegaram em três fragmentos: o Credo dos Apóstolos,
os cânones e o decreto senoidal. O Cânone Muratori,
do ano 170 d.C., portanto cerca de 150 anos anterior ao concílio, já
mencionava os evangelhos que fariam parte da Bíblia. Outros escritores cristãos
anteriores ao concílio, como Justino Mártir, Ireneu de Lyon, Papias de Hierápolis,
também já abordavam a questão dos evangelhos que fariam parte da Bíblia.
Sem
tratar-se de antissemitismo, mas apenas de diferenciar a fé cristã da fé
judaica e colocar balizas no que era ou não adequado aos fiéis cristãos e ao
seu culto próprio, para que não incorressem num injusto relativismo religioso,
o concílio de Niceia foi um marco neste sentido. Os posteriores concílios da
Igreja manteriam esta linha. O Concílio de Antioquia (341
d.C.) proibiu aos cristãos a celebração da Páscoa com os judeus. O Concílio de Laodiceia proibiu
os cristãos de observar o Shabbat e de receber
prendas de judeus ou mesmo de comer pão ázimo nos festejos judaicos.
O caráter, a
sociedade, e os problemas
A
cristandade do século II não concordava sobre a data de celebração da Páscoa da ressurreição. As igrejas
da Ásia Menor, entre
elas a importante igreja de Éfeso, celebravam-na, juntamente com os
judeus, no 14º dia da primeira lua da primavera (o 14º Nisan,
segundo o calendário judaico),
sem levar em consideração o dia da semana. Já as igrejas de Roma e
de Alexandria, juntamente com muitas outras
igrejas, tanto ocidentais quanto orientais, celebravam-na no domingo
subsequente ao 14º Nisan. Com vistas à fixação de uma data comum, em 154
ou 155 d.C., o bispo Policarpo de Esmirna,
entrou em contato com o papa Aniceto, mas nenhuma unificação foi
conseguida e o assunto permaneceu em aberto.
Foi
no concílio de Niceia que se decidiu então resolver a questão estabelecendo que
a Páscoa dos cristãos seria sempre celebrada no domingo seguinte ao plenilúnio após o equinócio da primavera. Apesar de todo
esse esforço, as diferenças de calendário entre Ocidente e Oriente fizeram com
que esta vontade de festejar a Páscoa em toda a parte no mesmo dia continuasse
sendo um belo sonho, e isso até os dias de hoje.
Além
desse problema menor, outra questão mais séria incomodava a cristandade
católica: como conciliar a divindade de Jesus Cristo com o dogma de fé num único
Deus?
Na
época, a inteligência dos cristãos ainda estava à procura de uma fórmula
satisfatória para a questão, embora já houvesse a consciência da imutabilidade
de Deus e da existência divina do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Nesse
quadro, um presbítero de nome Ário passa a defender em Alexandria a
ideia de que Jesus é uma "criatura do Pai", não sendo, portanto,
eterno. Em suas pregações, Ário por várias vezes insistia em afirmar em tom
provocativo que "houve um tempo em que o Filho não existia". Dizia
que Cristo teria sido apenas um instrumento de Deus mas sem natureza divina. A
esse ensinamento de Ário aderiram outros bispos e presbíteros. Sobretudo, o
bispo Eusébio de Cesareia,
conhecido escritor da igreja, que se colocou do lado de Ário.Quem se colocou ao
lado de Ário, foi Eusébio de Nicomédia. Este, por sua vez, era líder do partido
ariano. [ Justo L. González. Historia ilustrada do cristianismo, volume 1.
Paginas 167 a169]
Por
outro lado, a doutrina de Ário, ou arianismo, foi prontamente repudiada pelo
restante dos cristãos, que viam nela uma negação do dogma da Encarnação. O
repúdio mais radical talvez Ário tenha encontrado no bispo Alexandre de
Alexandria e no diácono Atanásio, que defendiam enfaticamente a divindade de
Cristo. Um sínodo foi convocado e a doutrina de Ário foi excluída da igreja
em 318 d.C.. Mas o número de seus adeptos já era tão grande que a doutrina
não pode ser mais silenciada. A situação se agravava cada vez mais e, desejoso
de resolver de vez a questão, o imperador romano Constantino, que recentemente, no ano
de 324 d.C., havia acrescentado o Império Romano do
Oriente a seus domínios, convocou um concílio ecumênico.
Dado
este importante, pois apesar de Constantino agora ser o imperador também do
oriente, mostra a independência que os bispos orientais (a maioria no concílio)
tinham do seu recente imperador.
Os procedimentos
O Concílio de Niceia.
O
concílio foi aberto formalmente a 20 de maio, na estrutura central do palácio
imperial, ocupando-se com discussões preparatórias na questão ariana, em
que Ário, com alguns seguidores, em especial Eusébio de Nicomédia, Teógnis de Niceia e Máris de Calcedônia,
parecem ter sido os principais líderes. As sessões regulares, no entanto,
começaram somente com a chegada do imperador. O imperador abriu a sessão na
condição de presidente de honra e depois, assistiu às sessões posteriores, mas
a direção das discussões teológicas ficou com as autoridades eclesiásticas.
Nem
Eusébio de Cesareia, Sócrates, Sozomeno, Rufino nem Gelásio de Cícico
proporcionam detalhes das discussões teológicas. Rufino nos diz tão somente que
se celebraram sessões diárias, as opiniões de Ário eram escutadas e discutidas
com seriedade, apesar que a maioria se declarava energicamente contra suas
doutrinas.
No
início os arianos e os
ortodoxos mostraram-se incondescendentes entre si. Os arianos confiaram a
representação de seus interesses a Eusébio de Cesareia,
cujo nível e eloquência fez uma boa impressão perante o imperador. A sua
leitura da confissão dos arianos provocou uma tempestade de raiva entre os
oponentes.
No
seu interesse, assim como para sua própria causa, Eusébio, depois de ter
cessado de representar os arianos, apareceu como um mediador. Apresentou o
símbolo (credo) baptismal de Cesareia que acabou por se tornar a base do Credo Niceno.
A
votação final, quanto ao reconhecimento da divindade de Cristo, foi um total de
300 votos a favor contra dois desfavoráveis. A doutrina de Ario foi
anatematizada e os dois bispos que votaram contra e mantiveram sua posição,
contrariando a posição do concílio, foram exilados pelo imperador.
A profissão de fé
e os cânones do Concílio de Niceia
O
Concílio de Niceia estabeleceu vinte cânones, os quais darão sequência ao Credo
Niceno. Um breve resumo de seu conteúdo:
·
Cânon I -
Eunucos podem ser recebidos entre os clérigos, mas não serão aceitos aqueles
que se castram.
·
Cânon II -
Referente a não promoção imediata ao presbiterato daqueles que provieram do
paganismo.
·
Cânon III -
Nenhum deles deverá ter uma mulher em sua casa, exceto sua mãe, irmã e pessoas
totalmente acima de suspeita.
·
Cânon IV -
Relativo a escolha dos bispos.
·
Cânon V -
Relativo a excomunhão.
·
Cânon VI –
Relativo aos patriarcas e sua jurisdição.
·
Cânon VII - O
Bispo de Jerusalém seja honorificado, preservando-se intactos os direitos da
Metrópole.
·
Cânon VIII -
Refere-se aos novacianos.
·
Cânon IX - Quem
quer que for ordenado sem exame deverá ser deposto, se depois vier a ser
descoberto que foi culpado de crime.
·
Cânon X - Alguém
que apostatou deve ser deposto, tivessem ou não consciência de sua culpa os que
o ordenaram.
·
Cânon XI –
Penitência que deve ser imposta aos apóstatas na perseguição de Licínio.
·
Cânon XII -
Penitência que deve ser feita àqueles que apoiaram Licínio na sua guerra contra
os cristãos.
·
Cânon XIII -
Indulgência que deve ser dada aos moribundos.
·
Cânon XIV –
Penitência que deve ser imposta aos catecúmenos que caíram em apostasia.
·
Cânon XV -
Bispos, presbíteros e diáconos não se transferirão de cidade para cidade, mas
deverão ser reconduzidos, se tentarem fazê-lo, para a igreja para a qual foram
ordenados.
·
Cânon XVI - Os
presbíteros ou diáconos que desertarem de sua própria igreja não devem ser
admitidos em outra, mas devem ser devolvidos à sua própria diocese. A ordenação
deve ser cancelada se algum bispo ordenar alguém que pertence a outra igreja,
sem consentimento do bispo dessa igreja.
·
Cânon XVII - Se
alguém do clero praticar usura deve ser excluído e deposto.
·
Cânon XVIII - Os
diáconos devem permanecer dentro de suas atribuições. Não devem administrar a
Eucaristia a presbíteros, nem tomá-la antes deles, nem sentar-se entre os
presbíteros. Pois que tudo isso é contrário ao cânon e à correta ordem.
·
Cânon XIX – As
regras a se seguir a respeito dos partidários de Paulo de Samósata que desejam
retornar a Igreja.
·
Cânon XX - Nos
dias do Senhor (refere-se aos domingos) e de Pentecostes, todos devem rezar de pé e não
ajoelhados.
Nas
atas do Concílio de Niceia, assinadas por todos os bispos participantes, com
exceção dos dois seguidores de Ario, constou o texto da seguinte profissão de
Fé:
“
|
Cremos
em um só Deus, Pai todo poderoso, Criador de todas as coisas, visíveis e
invisíveis; E em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho de Deus, gerado do Pai,
unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz da Luz, Deus
verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial do Pai, por
quem todas as coisas foram feitas no céu e na terra, o qual por causa de nós
homens e por causa de nossa salvação desceu, se encarnou e se fez homem,
padeceu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus e virá para julgar os
vivos e os mortos; E no Espírito Santo. Mas quantos àqueles que dizem:
'existiu quando não era' e 'antes que nascesse não era' e 'foi feito do
nada', ou àqueles que afirmam que o Filho de Deus é uma hipóstase ou
substância diferente, ou foi criado, ou é sujeito à alteração e mudança, a
estes a Igreja anatematiza
|
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Primeiro_Conc%C3%ADlio_de_Niceia
Nota: Parte da introdutória da matéria de Cristologia - o tema se mostra relevante uma vez que por meio desse evento histórico foi definido e defendido a doutrina da natureza de Cristo. Doutrina que esta presente não somente naquela que é hoje a Igreja Católica Apostólica Romana, mas também na maioria das igreja protestantes e evangélicas, entre elas a igreja Adventista do Sétimo Dia.
Ressalta-se ainda que o I Concílio de Niceia não encerrou os debates sobre a pessoa de Cristo. Vários bispos e simpatizantes do arianismo foram banidos do império. Um deles foi o bispo Úlfilas (c.310-383), missionário e tradutor da Bíblia entre os bárbaros godos. Quando estes invadiram o império, trouxeram de volta uma variante do arianismo. Constantino foi sucedido por dois imperadores arianos do império oriental, seu filho Constâncio II e Valente, o que trouxe sérios problemas para Óssio, Atanásio, Basílio e outros defensores do dogma trinitário A igreja cristã na história: das origens aos dias atuais, Franklin Ferreira. - São Paulo: Vida Nova, 2013, p.68).
Contrariando o desejo de Constantino, de unir o império após grande período de perseguição aos cristãos, sob uma só religião, o inimigo da verdade, mesmo tendo sido vencido num primeiro momento em relação a doutrina da natureza de Cristo, se valeu de instrumentos importantes como o bispo Úlfilas, para dar sequencia a disseminação do erro, irônico, onde havia sido empreendido esforços especiais para que o erro não tivesse mais força.
Ressalta-se ainda que o I Concílio de Niceia não encerrou os debates sobre a pessoa de Cristo. Vários bispos e simpatizantes do arianismo foram banidos do império. Um deles foi o bispo Úlfilas (c.310-383), missionário e tradutor da Bíblia entre os bárbaros godos. Quando estes invadiram o império, trouxeram de volta uma variante do arianismo. Constantino foi sucedido por dois imperadores arianos do império oriental, seu filho Constâncio II e Valente, o que trouxe sérios problemas para Óssio, Atanásio, Basílio e outros defensores do dogma trinitário A igreja cristã na história: das origens aos dias atuais, Franklin Ferreira. - São Paulo: Vida Nova, 2013, p.68).
Contrariando o desejo de Constantino, de unir o império após grande período de perseguição aos cristãos, sob uma só religião, o inimigo da verdade, mesmo tendo sido vencido num primeiro momento em relação a doutrina da natureza de Cristo, se valeu de instrumentos importantes como o bispo Úlfilas, para dar sequencia a disseminação do erro, irônico, onde havia sido empreendido esforços especiais para que o erro não tivesse mais força.
Comentários